Num contexto em que a eficiência energética e o conforto térmico são cada vez mais determinantes no setor da construção, a Danosa marca um passo histórico ao certificar o primeiro edifício Passive House não residencial em Portugal. Localizado em Pombal, este edifício de escritórios integra-se na unidade industrial da empresa e representa não só uma conquista técnica, mas também um compromisso claro com a sustentabilidade, o bem-estar das equipas e a inovação no setor da construção.
Nesta entrevista conduzida por Margarida Gamboa, conversamos com Pedro Ribeiro, Country Manager da Danosa em Portugal, que nos guia por todo o processo: desde a decisão de transformar o projeto inicial até à certificação final Passive House Plus. Uma conversa que revela os desafios, aprendizagens e ganhos concretos de apostar num edifício onde o desempenho energético é medido, verificado e sentido todos os dias.
Margarida Gamboa (MG) – Bem-vindo, Pedro. Pedro, para começarmos e para nos contextualizarmos: que edifício é este? Trata-se de um edifício de escritórios, mas está ligado à vossa unidade industrial, certo? Como é que surgiu este projeto?
Pedro Ribeiro (PR) – Boa tarde e obrigado pelo convite para falarmos sobre esta temática que nos une.
Este edifício está integrado, como disseste, na nossa unidade industrial, anexado às nossas fábricas. Por isso, tem algumas particularidades, para além do conforto térmico e da eficiência energética — nomeadamente, ao nível da acústica, que também foi uma preocupação desde o início. É um edifício administrativo, com dois pisos, onde funcionam todos os departamentos de apoio à produção e à empresa em Portugal.
Temos aqui as equipas comercial, técnica, atendimento ao cliente, finanças, recursos humanos. Toda a estrutura de suporte trabalha neste edifício.
MG – Este edifício tem uma particularidade: não foi inicialmente pensado para ser Passive House, certo?
PR – Exatamente. Quando arrancámos com o projeto não estava nos nossos planos certificar como Passive House. Essa decisão surgiu mais tarde, já com o projeto de arquitetura executado, quando decidimos adaptar o edifício para cumprir esse padrão.

MG – E o que vos levou a tomar essa decisão, já numa fase mais avançada?
PR – Principalmente questões relacionadas com o conforto da nossa equipa. Queríamos criar um espaço onde nos sentíssemos bem, seguros, com qualidade do ar interior adequada até porque passamos aqui grande parte do nosso tempo, muitas vezes mais do que em casa. Era fundamental criar um ambiente saudável e confortável.
Depois, havia também um alinhamento com o core do nosso negócio. Somos fabricantes de isolamento térmico, faz todo o sentido, enquanto produtores de soluções de isolamento passivo, associarmo-nos ao padrão mais exigente de conforto térmico: o Passive House. Especialmente porque o edifício está mesmo ao lado da linha de produção de XPS (poliestireno extrudido), onde os nossos produtos são aplicados na prática.
MG – Tomam então essa decisão com o projeto já em curso. O que tiveram de fazer para o adaptar?
PR – O primeiro passo foi introduzir o edifício no PHPP (Passive House Planning Package) e perceber em que ponto estávamos e o que era necessário alterar. Sabíamos que não ia ser uma surpresa positiva e que haveria intervenções necessárias.
Tínhamos, por exemplo, muitos vãos virados a nascente, o que desde logo sabíamos que seria uma condicionante. O PHPP confirmou isso e apontou vários pontos críticos, nomeadamente pontes térmicas que teriam de ser corrigidas. A partir daí, analisámos caso a caso e definimos soluções para cumprir os requisitos Passive House.
MG – Vocês contaram com apoio especializado durante este processo. Que importância teve essa consultoria?
PR – Foi essencial. A partir do momento em que decidimos avançar com a certificação, contactámos a Homegrid, que passou a liderar a coordenação entre todos os stakeholders e especialidades envolvidas.
Primeiro carregámos o projeto no PHPP, depois analisámos os resultados e, finalmente, definimos os planos de ação. Foi preciso compatibilizar o projeto com arquitetura, especialidades e com o dono de obra perceber o que era viável alterar e o que não era. No final, conseguimos chegar a um equilíbrio que satisfez todos e mantivemos o projeto dentro do padrão Passive House.
MG – Conseguiram manter grande parte do projeto original?
PR – Sim, a arquitetura praticamente não foi alterada. Foram discutidas algumas alterações mais profundas, mas acabámos por optar por soluções técnicas alternativas para não comprometer o conceito arquitetónico inicial.
MG – E em obra, que desafios enfrentaram?
PR – Em projeto, o maior desafio foi a compatibilização entre todos os intervenientes. Mas na obra os desafios multiplicaram-se, com a entrada do construtor, da fiscalização e dos vários subempreiteiros, que mudavam frequentemente.
Foi necessário sensibilizar e formar todos os envolvidos. A Homegrid deu uma primeira formação ao construtor e à fiscalização. Mas os subempreiteiros, que executavam efetivamente a obra, não receberam essa formação, o que exigiu uma supervisão diária intensa.
O momento de viragem foi quando reprovámos o teste de estanquidade ao ar. Ver o fumo a sair pelas caixilharias foi um choque visual para todos e fez com que a equipa percebesse, de forma clara, onde estavam as falhas. A partir daí, a atitude mudou.
MG – Esse momento marcou a consciência coletiva de que não havia margem para “mais ou menos”, certo?
PR – Sem dúvida. Até aí, havia quem pensasse que isto era só uma exigência do cliente ou do arquiteto. Mas nesse momento perceberam que estávamos a perder calor de forma absurda. Perceberam o impacto real das falhas e a necessidade de as resolver foi um ponto de viragem.
MG – O edifício foi aprovado no segundo teste e, mais do que isso, alcançou a certificação Passive House Plus. Em termos de custos, foi mais caro?
PR – Não, em termos de custos, não houve impacto significativo. O que houve foi impacto no prazo da obra, porque não era um projeto concebido de raiz como Passive House. Houve tempo de espera entre especialidades, reavaliação de soluções e ajustes. Mas no custo direto da construção, não. Até houve poupança com a eliminação de vários splits de climatização.
MG – Se o projeto tivesse sido pensado desde o início para Passive House, o prazo teria sido mais curto?
PR – Sem dúvida. Teria permitido ajustar logo a geometria, orientação, distribuição de vãos… Tudo podia ter sido otimizado de início, o que teria facilitado a obra e reduzido o prazo.
MG – E por que era importante para vocês ter a certificação?
PR – Porque sem a certificação não tínhamos uma garantia real de desempenho. Podíamos dizer que o edifício era eficiente, mas isso seria só discurso. A certificação comprova de forma objetiva que o edifício cumpre determinados critérios de conforto e eficiência.
MG – E agora que já habitam o edifício há vários meses, como tem sido a experiência?
PR – Estamos aqui desde 17 de outubro (de 2024). Passámos o inverno e posso dizer que a experiência tem sido muito positiva. A utilização de splits tem sido mínima. Só em dias muito frios usamos algum reforço e mesmo assim, por exemplo, o meu gabinete, creio que ainda nem liguei o split este ano.
MG – E quanto à qualidade do ar?
PR – Nota-se bastante a diferença, sobretudo em comparação com o edifício anterior. É verdade que o anterior tinha mais pessoas no mesmo espaço, mas mesmo em condições semelhantes, a qualidade do ar aqui é muito superior.
MG – Para ti, o que distingue uma Passive House?
PR – O facto de medirmos no local. A certificação energética tradicional baseia-se em cálculos teóricos, mas na Passive House há testes reais como o da estanquidade ao ar que nos mostram o desempenho efetivo. Isso permite atuar e corrigir. Além disso, o sistema está muito bem pensado: controlamos as trocas de ar e usamos esse ar para aquecer ou arrefecer, com o mínimo de energia possível, graças ao isolamento passivo.
MG – E agora, mesmo para terminar: numa palavra, o que é a Passive House?
PR – Conforto. Mais do que tudo, conforto.
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