Construir uma casa vai muito além de paredes e telhados, é sobre criar um espaço confortável, eficiente e pensado para o futuro. Nesta entrevista, Cibele Santos partilha a sua experiência ao construir a sua própria Passive House, os desafios enfrentados e as decisões que marcaram o caminho até uma casa mais eficiente e confortável.
Margarida Gamboa (MG) – Cibele, muito bem-vinda às Conversas Passive House. A Cibele é dona de obra de uma das próximas Passive House certificadas, assim esperamos. É gestora tributária e esta casa será o novo lar da sua família, uma família de quatro, já que tem dois filhos. Conta-nos um pouco, enquadra-nos sobre que projeto é este. Como vai ser esta casa?
Cibele Santos (CS) – Esta casa é térrea, tem apenas um piso e está rodeada de um terreno bastante grande, porque um dos nossos objetivos era esse.
MG – Quantos metros quadrados é que ela tem?
CS – No final, livres, vão ficar cerca de 155 metros quadrados.
MG – É em zona urbana ou mais rural?
CS – Zona rural.
MG – Só para quem nos ouve e vê poder também ter aqui o enquadramento do que estamos a falar. Conta-nos um pouco como é que decidiste, ou como é que vocês decidiram, construir uma Passive House e porquê?
CS – Já é um projeto antigo. Quando comprámos a última casa, percebemos que ela não era bem aquilo que esperávamos, nem em termos térmicos nem acústicos. Ficámos muito dececionados e decidimos que teríamos de partir para outra coisa. Isto foi há cerca de 15 ou 16 anos.
Entretanto, nessa procura, percebemos que, se fôssemos comprar uma casa já feita, iríamos ter o mesmo problema, porque a construção em Portugal é bastante fraca. Teríamos novamente problemas térmicos, acústicos e de qualidade do ar. Portanto, partimos para o projeto de construção.
Pesquisei várias formas de construir, diferentes métodos que fossem não só eficientes do ponto de vista energético, mas que garantissem conforto a quem ocupasse a casa. Foi aí que encontrei o conceito Passive House. Depois de o conhecer melhor, eu e o meu marido decidimos que tinha mesmo de ser uma Passive House.
MG – E quais foram os fatores que te levaram a essa decisão? Se pudesses destacar um ou dois principais motivos que diferenciaram a Passive House de tudo o resto que já tinhas lido até então, o que seria?
CS – A primeira coisa que me chamou a atenção foi a qualidade do ar. Tanto eu como as minhas filhas precisamos disso, já que temos alguns problemas respiratórios na família. Precisávamos mesmo de uma casa com boa qualidade do ar interior.
Depois, a parte térmica é extremamente importante, queremos conforto térmico, que nunca tivemos até hoje, e também o conforto acústico, para não ouvir os vizinhos ou os ruídos do exterior. E, por fim, o conforto económico. Acabei de fazer 50 anos e já estou a projetar o futuro. Não quero gastar demasiado dinheiro para aquecer ou arrefecer a casa, acho isso um disparate, principalmente com a economia atual. Por isso, queríamos uma casa eficiente, que consumisse pouca energia para se manter confortável.
MG – Neste momento a casa já está em fase de finalização. Mas, voltando um pouco atrás, que desafios enfrentaram durante a fase de projeto?
CS – A fase de projeto foi relativamente simples porque, desde o início, partimos para o conceito Passive House. Informámos o arquiteto e percebemos que precisávamos de consultores, já que ele nunca tinha feito uma casa deste género. Queríamos que o processo fosse feito corretamente desde o início.
O primeiro desafio sério foi na fase dos orçamentos. O mercado estava caro e tivemos de tomar uma decisão radical: ou mantínhamos o conceito Passive House ou o tamanho e os acessórios da casa. Decidimos cortar na área, reduzimos 45 metros quadrados, e eliminámos elementos acessórios como um dos muros de sustentação e a cobertura para os carros. Mantivemos o essencial: o conceito Passive House. Era o motivo pelo qual estávamos a construir. Caso contrário, não valeria a pena.
O segundo desafio foi escolher a empresa que iria construir a casa. Muitas empresas mostraram-se apreensivas quando souberam que queríamos uma Passive House certificada. Não podia ser uma construção “feita à balda”; tinha de ser feita como deve ser.
MG – E agora, olhando para trás, abdicar de área foi mesmo a decisão certa?
CS – Foi, sem dúvida. Acho que, enquanto clientes, sobrevalorizamos a necessidade de ter áreas muito grandes, mas isso nem sempre é verdade. A casa está praticamente pronta e percebo que é grande o suficiente para nós os quatro. Não vai faltar espaço. Foi uma boa decisão.
MG – E na fase da obra? Como ultrapassaram os desafios? Já falaste da mão de obra, que é uma questão recorrente.
CS – No geral, foi uma experiência interessante. Acompanhámos a obra de perto, tentando estar sempre atentos aos detalhes. O maior desafio foi mesmo a mão de obra, sobretudo na fase da estrutura. Os principais problemas tiveram a ver com a estanquidade ao ar. Felizmente, antecipámos problemas, o que foi crucial.
Quando foi altura de abrir os roços para canalização e eletricidade, percebemos que algo não estava bem. Graças aos bons parceiros que tivemos, corrigimos antes do teste. Foi stressante, mas passámos o teste sem problemas. O segredo foi antecipar e corrigir antes de ser tarde.
MG – E qual foi a importância do acompanhamento técnico nesta fase?
CS – Fundamental. Fazer uma casa destas sem acompanhamento especializado é um risco enorme. Tivemos o apoio da Homegrid, e foi essencial. Mesmo que o projeto estivesse bem feito, surgem sempre desafios em obra, muitos ligados à falta de experiência dos trabalhadores.
As pessoas têm o hábito de fazer as coisas “à pressa”, e a Passive House exige que se faça bem feito. O papel dos consultores foi essencial, assim como o diálogo entre o arquiteto, a empresa de construção e os consultores. Esse diálogo constante foi o segredo do sucesso.
MG – Agora que a casa já passou o blower door test (teste de estanquidade de ar), embora ainda não estejam a morar lá, já se sente diferença quando entras na casa?
CS – Sim, e há bastante tempo. Desde que pusemos as janelas, a porta e a casa ficou fechada para o teste, a diferença já se notava. Lembro-me de entrar na casa ainda em bruto, com os tijolos à vista, numa manhã com três graus negativos lá fora, e lá dentro estavam vinte graus. Confortável e sem aquecimento ligado. A temperatura é homogénea em toda a casa, o que é espetacular.
MG – Imagino que a expectativa para a mudança seja enorme.
CS – Sim, está em alta! Toda a família está entusiasmada. Até quem trabalhou na obra reparava no conforto, ninguém queria abrir as janelas para manter o calor lá dentro.
MG – E vão mesmo certificar a casa. Porquê?
CS – Sim, decidimos logo no início que iríamos certificar. É claro que a certificação tem custos, mas considero que é um investimento, não uma despesa.
Primeiro, responsabiliza todos os envolvidos. É muito diferente dizer ao construtor “estamos a construir uma casa certificada” do que simplesmente pedir uma casa com determinados padrões. Segundo, valoriza o imóvel. No futuro, se quisermos vender, ter a certificação aumenta o valor e a confiança dos compradores.
MG – É uma garantia de que todo o trabalho foi bem feito.
CS – Exatamente. Dá-nos essa segurança.
MG – Se tivesses que descrever a Passive House numa palavra ou numa frase, o que dirias?
CS – Conforto.
MG – E a expectativa agora é usufruir dele muito em breve.
CS – Sim, sem dúvida!
MG – Cibele, muito obrigada! Foi um prazer falar contigo. Vamos certamente acompanhar o pós-habitar e ver como tem sido a experiência.
CS – Obrigada eu!
Veja a entrevista aqui.