Pedro Rio é um informático que desde há alguns anos se interessa pela qualidade do ar interior. Quando em 2019 começou a procurar casa para a família soube que queria conforto e saúde. E encontrou as respostas no conceito Passive House.
Mora desde setembro de 2021 numa moradia geminada de dois andares com 116 m2 de área útil, na zona de Lisboa, que comprou já com projeto aprovado e onde fez ao longo da construção as alterações necessárias para a aproximar ao máximo o conceito. Quais as dificuldades? Os desafios? As principais alterações? Os resultados?
(notas do autor)
1. o peso da climatização representa cerca entre 20 a 25 % do total do consumo energético da habitação;
2. As necessidades anuais de aquecimento foram estimadas em cerca de 8 KWh/m2.ano ou cerca de 1000 KWh/ano, de acordo com o PHPP (considerando a temperatura base de 20 C no período de aquecimento e os dados climáticos históricos);
3. O peso do standby e do motor da piscina (consumos permanentes) correspondem a cerca de 25% num mês de inverno, aumentando o seu peso relativo no período de arrefecimento;
Como é que surge o interesse pelas Passive House?
Em 2019 chamou-me a atenção a temática da qualidade do ar. Quando surgiu a oportunidade de comprar casa, em inícios de 2020, deparei-me com a questão de garantir a qualidade do ar com uma máquina que faz a sua renovação, as VMC’s (Ventilação Mecânica Controlada). Pesquisa leva a pesquisa e cheguei às Passive House, inicialmente pelo facto de terem quase sempre uma VMC. Despertou-me a curiosidade e percebi que pressupunha super eficiência energética, com isolamento térmico e acústico, que são coisas que valorizo imenso. Isso agradou-me muito, tanto do ponto de vista pessoal como ambiental, gastando menos energia do que seria expectável, o que é ótimo.
Mas escolheu uma casa que já tinha projeto e que não estava pensada para ser uma Passive House…
Sim, o projeto já estava feito. Mas eu já tinha percebido algumas coisas, nomeadamente que a qualidade do ar interior é algo difícil de manter porque tinha um aparelho que me dava esses registos. E saber que isso podia ser feito automaticamente interessou-me! Tinha era de perceber se ainda ia a tempo ou não.
Fui pesquisar e perceber o que é que podia ser feito para a aproximar ao máximo ao conceito. Falei com uma empresa especializada em Passive House, a Homegrid, e começámos um trabalho de consultoria. Fizeram primeiro uma análise do projeto da casa, recorrendo nomeadamente ao PHPP, e depois à medida que foram encontrando questões faziam sugestões de alterações que, em conjunto com o empreiteiro, fomos tentando adotar.
Quais as principais alterações que foram feitas na execução para tornar a casa mais próxima do conceito Passive House?
Foram feitas várias modificações. Alterou-se as espessuras dos isolamentos: paredes exteriores passaram de 6 para 10 cm e na cobertura as espessuras também foram alteradas. O tipo de tijolo também foi trocado: passou de tradicional para bloco térmico.
Houve trabalho nas janelas, para garantir a melhor performance acústica e térmica, tanto da caixilharia como dos vidros (tem, por exemplo, um perfil separador do vidro duplo específico, em PVC), bem como no isolamento à volta das janelas para evitar as pontes térmicas.
Foi colocado isolamento entre o chão e o primeiro tijolo para corrigir as pontes térmicas na junção do chão com o tijolo. Por baixo do pavimento utilizámos também um género de borracha que “amortece” um pouco o som de coisas a arrastar ou a cair e assim melhorar o isolamento acústico. Foi ainda colocado isolamento acústico nas paredes de junção com a casa ao lado.
Em relação à estanquidade do ar foram feitas algumas coisas simples, nomeadamente pintar algumas zonas com Soudatight para evitar a passagem do ar.
Outras coisas não foram possíveis de alterar: por exemplo, a exposição solar da casa não é a ideal mas aí já estava assim em projeto e não foi possível mudar, bem como o posicionamento das escadas, por exemplo, que sendo uma moradia geminada não é ideal.
Falando do que não foi possível mudar, quais as dificuldades na execução?
Em termos da comunicação com o empreiteiro foi fácil porque felizmente tinha uma pessoa com vontade de fazer coisas novas e diferentes, perceber como é que funcionam. Existiram algumas adaptações de aspetos que ele não conseguia dar garantia de futuro por nunca ter executado e por isso teve mais dificuldade em comprometer-se. Tive de encontrar um ponto de equilíbrio.
Algumas situações foram de tal forma novidade que causaram estranheza e surpresa! Por exemplo, no caso do perfil separador em PVC nas janelas, falei com o fornecedor dos vidros e ele disse-me simplesmente: “Isso não se faz. Isso é tudo em alumínio. E não tem nada a ver com a térmica porque já é vidro duplo”. Pareceu-me ficar até um pouco insultado, como se eu estivesse a colocar em causa o seu Know-how, e eu pensei “Bem, estou tramado para conseguir fazer isto”. Mas eu sabia que estava certo e falei com o empreiteiro: ao que parece o fornecedor já lhe tinha ligado a falar da “novidade” e se aquilo era mesmo possível. Afinal tinha ficado apenas com medo de parecer pouco profissional ou conhecedor. E por vezes há esse receio.
Analisando custo de investimento e benefícios, qual o balanço?
Aquilo que eu queria era conforto térmico, não queria ouvir os cães a ladrar na rua ao ponto de me incomodar, por exemplo, e queria boa qualidade do ar. O custo não posso dizer que tenha sido barato (também não existia um projeto Passive House de raiz), e posso indicar que gastei cerca de 10% extra (custo material e execução, à parte da consultoria). Olhando para trás sei que em algumas coisas podia ter poupado, mas também não consigo hoje ter a certeza que se fossem outros materiais teria o mesmo resultado. Agora ganha-se em viver aqui: é muito confortável, não se passa frio. Em termos de gastos energéticos, eu ainda só tenho dados mais fidedignos desde Dezembro (meses de inverno) mas deve estar ligeiramente acima da referência Passive House de 15 kWh/m2.a.
Como exemplo, o consumo energético total medido em Dezembro foi de 1090 kWh (imagem em anexo), o que se traduziu em 223 euros de fatura de eletricidade. Alertar que há um motor de piscina que consome 800Wx4h/dia e só aí estão 96 kWh. Depois há o stand-by da casa, que representa mais 144 kWh. As máquinas de lavar loiça e roupa, a de secar, o forno e, claro, o piso radiante, que têm aqui uma grande fatia do consumo. Tenho ainda um termossifão que tem tido sempre a resistência ligada nesta fase.
Mas a verdade é que tudo isto se traduziu numa temperatura interior na sala, por exemplo, entre os 21 e os 23 graus.
Em termos de qualidade do ar, também tem estado perfeitamente dentro do esperado: a sala consegue registar uma concentração de CO2 abaixo dos 1000pm em geral.
O saldo tem sido positivo?
Absolutamente. Gosto muito de cá viver, é extremamente agradável. Não tenho um antes para comparar que seja equivalente. Vivia num apartamento com 50 anos. Mas o que aqui consegui está completamente dentro da minha expectativa.
Por fim, apesar da moradia estar próxima do conceito Passive House ela não está certificada. Pensa na Certificação?
Existiram coisas que não foram pensadas atempadamente e não foi possível alterar, por isso vai ser difícil a casa passar no Blower Door Test. Gostava apenas para “certificar” o meu investimento. Seria uma mais valia mas sobretudo para vender, que não é algo em que estejamos a pensar, então o que conta é como nos sentimos aqui!